A digital influencer e youtuber Sá Ollebar, criadora do projeto digital Preta Pariu, iniciou um experimento na plataforma Instagram, rede social pertencente ao grupo Facebook. No último sábado, 10, após perceber a crescente queda nos índices de alcance digital, a paulista publicou fotografias de modelos caucasianas (brancas) em seu perfil e analisou as métricas de engajamento.
Surpreendentemente, a ferramenta de estatísticas aferiu um aumento de 6000% em seu alcance na rede social. Entristecida, a digital influencer publicou em uma das legendas de suas postagens. “O Instagram só entrega meu conteúdo para quem me segue, se uso foto de mulher branca! Esse assunto me pegou de jeito”, disse.
Creator há seis anos, Sá Ollebar dedica-se à produção de conteúdo digital e possui por nicho o autocuidado feminino, práticas de yoga, bem-estar e maternidade consciente. Contudo, apesar de desenvolver seu trabalho em demais redes sociais, tais como o TikTok, YouTube e Twitter, a digital influencer afirma ter vivenciado dificuldades quanto a distribuição de seu conteúdo através do Instagram. A manter um perfil que, atualmente, possui mais de 80 mil seguidores, a denúncia veiculada por Sá Ollebar trouxera à tona uma temática extremamente discutida entre digital influencers negros: o racismo algorítmico.
Há anos, diversos criadores de conteúdo denunciam o funcionamento racialmente enviesado das plataformas digitais. Há alguns meses, uma matéria produzida pelo veículo The Intercept comprovou a ocultação proposital de usuários considerados “feios” e “pobres” no aplicativo TikTok. Recentemente, o Twitter tornara-se alvo de denúncias. Pois, ao alavancar a hashtag #algoritmoracista, usuários demonstraram a preferência algorítmica por expôr indivíduos brancos com maior frequência. O Instagram recebera inúmeras denúncias ao decorrer dos anos. Dentre elas, a perceptível vantagem concedida aos usuários, os quais publicam imagens de pessoas caucasianas e evitam abordar temáticas consideradas polêmicas, tal as políticas.
Após a enorme visibilidade alcançada, diversos digital influencers negros pronunciaram-se e demais usuários optaram por aderir ao experimento do racismo algorítmico. Produtores de conteúdo reconhecidos, como Luana Carvalho, Triscila Oliveira, Kleriene Vilela, Ashley Malia e Leví Kaique Ferreira expuseram o ocorrido em suas redes sociais e explanaram suas experiências enquanto produtores de conteúdo em plataformas racialmente enviesadas.
Assunto na universidade
O racismo algorítmico alcançara proporções tão elevadas, ao ponto de tornar-se temática no cenário acadêmico. O livro “Algorithms of Oppression” (Algoritmos da Opressão), em tradução livre, produzido pela teórica afro-americana Safiya Umoja Noble, versa a respeito da relação entre o racismo estrutural e o aperfeiçoamento da performance algorítmica. Projetos nacionais, a exemplo do Conexão Malunga, portal baiano que possui por nicho tecnologia e autonomia digital, produzem conteúdo a respeito desta problemática.
A ativista e pesquisadora Glenda Dantas, integrante do Conexão Malunga, traz um panorama das reverberações do racismo estrutural na área das tecnologias digitais. “O racismo algorítmico em si discrimina o conteúdo de pessoas racializadas, especialmente imagens. Em Brasil e Estados Unidos, tem-se percebido através de casos no Twitter e Instagram. Estes casos somente evidenciam o quanto o racismo algorítmico tem impactado pessoas pretas ao redor do mundo. Criadores de conteúdo pretos não são chamados para publicidades e poucos atingem a marca de um milhão de seguidores. Os dados demonstram como o racismo afeta a geração de renda e a representatividade através das redes sociais. Quando pensamos que o algoritmo dita aquilo que o usuário receberá de conteúdo, e quando percebemos que quem produz esses algoritmos são pessoas brancas, entendemos que os algoritmos que constroem as redes sociais que utilizamos massivamente baseiam-se em nenhuma diversidade”, disse.
A criadora de conteúdo e idealizadora da campanha Carnaval sem Gordofobia Luana Carvalho tratou-se de uma dentre as digital influencers negras a realizarem o experimento. A ativista digital partilhou suas experiências através do Twitter e expôs as controvérsias deste cenário que permanece hostil aos produtores de conteúdo negros. O racismo algorítmico atrelado às limitações impostas pelas opressões sociais clássicas, fomenta um ambiente imensamente nocivo à saúde mental e ao progresso financeiro de criadores de conteúdo negros.
“O Instagram anda cortando o alcance de muita gente e isso atingiu muitos criadores de conteúdo negros, eu também entrei nessa lista. Depois de sofrer um ataque monstruoso no Facebook por um tuíte que fiz, meu perfil estagnou e foi bem na época em que o primeiro debate sobre algoritmo apareceu. Desde então, meu engajamento diminuiu muito, mesmo produzindo bastante para ver se ele voltava. Foi quando vi a Sá [Sá Ollebar] desabafando sobre isso e postando fotos de mulheres brancas do mesmo nicho que ela e o engajamento magicamente voltou. Resolvi fazer isso e o mesmo aconteceu”, conta.
Luana Carvalho conclui a afirmar o quão perniciosas as relações digitais tornam-se ao serem intermediadas pelo racismo estrutural. As constantes agressões afetam a integridade emocional, financeira e social da população negra. “O algoritmo trabalha da mesma forma, afeta diretamente nossa saúde mental porque já temos que ser mil vezes melhores do que criadores de conteúdo brancos e ainda por cima somos sabotados pela plataforma”, acrescenta.
Foto de capa: Reprodução/Instagram.
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Autora do site “Minha Doce Paranoia”. Também é escritora, atriz, discente em Jornalismo na Universidade Federal da Bahia (UFBA). Em 2017, estreara no espetáculo “De Ponta Cabeça: Baobá” e tornara-se integrante do projeto literário “Escritoras Negras da Bahia”. Em 2018, dera origem ao projeto feminista “Vulva Negra”. Integrante da antologia literária “Tributo aos Orixás”, publicada pela Darda Editora, integrara igualmente a coletânea fotográfica e literária “Profundanças 03”. Primeira finalista do Prêmio Malê de Literatura 2019.