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Cia de Teatro da UFBA estreia espetáculo “Eduardo II” dia 26 de outubro

Com elenco e equipe majoritariamente preta e LGBTQIAPN+, Eduardo II tem encenação dos prestigiados e premiados diretores teatrais Thiago Romero e João Sanches – que também assume dramaturgia

A Cia de Teatro da UFBA estreia a temporada da peça “Eduardo II, entre os dias 26 de outubro a 12 de novembro, no Teatro Martim Gonçalves, de quinta a domingo, às 19h, com entrada totalmente gratuita. Território e Corpo. A margem, para além dela, dissidências. As garras de um tigre negro queer para manter-se rei. Esse é o ponto de partida do espetáculo.

A obra revisita fatos históricos para abordar uma série de questões contemporâneas como polarização política, autoritarismo, manipulação da opinião pública, LGBTfobia, misoginia, discriminação de classe e de raça. 

Foto: Caio Lírio

A dramaturgia desta obra é um texto inédito de João Sanches – também docente da Escola de Teatro da UFBA, inspirado na obra de Christopher Marlowe, na adaptação de Bertolt Brecht e em fatos reais ocorridos na Inglaterra do século XIV e no Brasil atual.

A encenação é assinada pelo multiartista Thiago Romero, em parceria com o dramaturgo e diretor João Sanches – artistas premiados que se juntam pela primeira vez, num projeto com mais de 25 pessoas, de maioria negra e LGBTQIAPN+, sendo 17 atuantes em cena. 

O elenco conta com Diogo Teixeira, Manu Moraes e Hamilton Lima; com os professores da Escola de Teatro Cláudio Cajaíba e Mateus Schimith; com as artistas-mestrandas Fernanda Silva, Diego Alcântara e Saulo Ilogoni; além das estudantes da graduação Cícero Locija, Leandro França, Kalu Santana, Maria Pereira, João Victor Sobral, Adrían Araújo, Ubatã, Gabriel Fayndé e Lucas Arruda.

A ficha técnica traz ainda os nomes de Luciano Bahia, na trilha sonora; Daniela Botero, na direção de movimento; e Bergson Nunes, na coordenação de produção. 

Agrupamento

Encruzilhada, ficção e realidade, a montagem trata de questões interseccionais que, além de estarem diretamente ligadas aos corpos e às subjetividades de todas as pessoas da equipe, colocam em evidência assuntos urgentes de interesse público, recorrentes nos debates atuais, e que reverberam nos estudos da cena contemporânea. A peça gira em torno da relação homoafetiva entre o rei Eduardo II e o plebeu Daniel Gaveston. 

A intriga é desencadeada a partir da volta de Gaveston, que havia sido exilado pelo pai de Eduardo II. Contrariando os nobres e os religiosos, assim que é coroado, Eduardo II permite a volta do seu amado, lhe concedendo muitos títulos e bens.

O que desperta o ódio e a reação das elites. A divisão interna do reino, causada pelas desigualdades e agravada pela crise econômica, somada a uma campanha difamatória motivada por homofobia, abre espaço para a guerra civil. 

Um golpe. Com todos, com o supremo, com tudo. O povo, num primeiro momento, apoia o golpe, a insubordinação ao rei Eduardo II e a perseguição ao seu companheiro. No tempo, a crise só aumenta e os novos ocupantes do poder mostram seus reais interesses e métodos inconfessáveis, o que leva a população a rever suas próprias escolhas. Brasil?.

“Com o impeachment de Dilma, o país entrou num processo reacionário de instabilidade institucional, polarização, golpismo e violência que a história de Eduardo II ilustra muito bem. Desde então, a encenação dessa história tornou-se uma necessidade para nós, pois ela discute as diferentes camadas dessa situação tão delicada e complexa que nos envolve atualmente”, argumenta o dramaturgo.

Encruzilhada Cênica

Num palco revelado, cheio de praticáveis e de muitas plantas (espadas de São Jorge), um coro de trabalhadores conta a sua própria história para o público, atuando na narração dos acontecimentos e na interpretação de diversos personagens; na manipulação de objetos, cenários e figurinos; e também na operação ao vivo de luz e som do espetáculo.

Juntos, esses operários da Arte, em toda sua diversidade e polifonia, performam uma nova versão dessa fábula, apontando para um futuro possível. 

O trabalho cruza as pesquisas dos dois diretores, ambas relacionadas à cena contemporânea: Thiago Romero, doutorando do PPGAC-UFBA, estuda estratégias de Afrofabulação, em busca de um “Teatro da Bixa Preta” (título de sua dissertação de mestrado); enquanto João Sanches, que realiza atualmente pós-doutorado no PPGCOM da UFRB, estuda as relações entre Dramaturgia e Performance – tema que também abrange o recorte de Thiago. 

A encenação de Sanches e Romero – embora bem diferentes entre si e muito em comum – flerta com a cultura pop, a estética queer e camp, o viés crítico-reflexivo, a exploração da visualidade, isso tudo articulado com o gosto pelo poder das palavras e o amor ao texto.

“Embora seja nossa primeira encenação compartilhada, parece que já trabalhamos há anos, pois nos revezamos em tudo, com um espírito de total cooperação e admiração mútua – tem sido um presente pra mim esse processo: alegre, leve, criativo e afetuoso”, declara João Sanches. 

Remake

Quinquagésima oitava obra da Cia de Teatro da UFBA, a montagem é o primeiro “remake” da Cia. Em 1986, o diretor e ator Harildo Déda – um dos principais nomes do teatro baiano falecido em setembro 2023 – encenou “A Vida de Eduardo II da Inglaterra”, com imponentes cenários e figurinos de Ewald Hackler, premiados na época pelo Troféu Martim Gonçalves.

O texto da primeira versão foi uma tradução da adaptação de Brecht, cuja revisão final foi assinada por Cleise Mendes em parceria com Harildo e Hackler. 

Serviço

O quê – Eduardo II” – direção João Sanches e Thiago Romero, Cia de Teatro da UFBA

Quando – 26 de outubro a 12 de novembro – de quinta a domingo, 19h

Onde – Teatro Martim Gonçalves (Canela)

Entrada – Gratuita, ingressos disponíveis na plataforma Sympla

Foto de capa: Caio Lírio

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