Março foi o mês mais letal da pandemia do Covid-19 no Brasil, até agora. Foi quando houve o maior colapso sanitário e hospitalar da história do País. Em Pernambuco, não foi diferente, pois aqui foi registrado o maior recorde de mortes em 24 horas por causa da doença, 74 óbitos, e o maior número de novos casos em um único dia, 2.227 infectados, desde março do ano passado. Além da falta de leitos de UTI na capital com ocupação máxima desde janeiro, atingindo o limite no mês passado com taxa superior a 90%.
Foi neste cenário que a Articulação Negra de Pernambuco (Anepe) enviou uma carta à secretaria de saúde do Estado no último dia 26 de março. A carta foi assinada por cerca de 20 entidades negras e antirracistas que compõem à Anepe. No documento, a organização demonstrou preocupação com a ausência de dados acessíveis ao público sobre a população negra vacinada contra o Covid-19. A ideia foi cobrar as autoridades mais transparência nos dados percentuais por raça, já que a informação racial pode ser mapeada, através do cadastro do “Conecta Recife” [aplicativo da prefeitura para agendamento da vacina], no qual consta a opção raça/cor.
Vacinação
No ranking dos estados nordestinos que mais vacinaram, Pernambuco ocupa o quinto lugar, logo atrás da Bahia, Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte e seguido por Piauí, Alagoas, Sergipe e Maranhão. O processo de imunização do Estado pernambucano está em 977.207 pessoas vacinadas com a primeira dose, o que representa 13,4% da população adulta e 277.355 vacinados com a segunda dose, o equivalente a 3,8 % da população adulta.
A técnica de enfermagem que trabalha na UTI do Oswaldo Cruz, hospital referência no tratamento de Covid-19, Perpétua Socorro, 52, foi a primeira pessoa a receber a vacina no Estado. Pelo menos este era o perfil social da maioria das primeiras vacinadas nas capitais nordestinas, mulheres negras da saúde.
Mesmo tendo iniciado assim, a campanha de vacinação não continuou priorizando esta população. Já que de acordo com a Agência Pública, até o dia 14 de março, dos 4,5% (8,5 milhões de pessoas) da população brasileira vacinada com a primeira dose, apenas 1,48% (1,7 milhão de pessoas) desta população era negra.
Contradição
Essa informação é muito contraditória, tendo em vista que, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), tanto a população brasileira (56%) quanto a pernambucana (63%) é composta em sua maioria por pessoas negras. Sendo ainda essa população a base dos profissionais da saúde, sobretudo técnicos de enfermagem, assistentes sociais, enfermeiros e auxiliares de serviços gerais. A ausência de dados sobre esta parcela da população além de configurar racismo institucional, produz irrealidades que vulnerabilizam a saúde do povo negro, quem mais sofre com a pandemia.
Em conversa com o Site Negrê, um dos coordenadores da Anepe, Henrique Costa, disse: “Até o momento, não houve nenhuma resposta oficial da secretaria de saúde de Pernambuco. Além dessa carta, anteriormente, em abril do ano passado, nós enviamos uma outra carta, solicitando que houvesse a publicação de dados desagregados por raça sobre adoecimento e morte em decorrência do Covid-19 e naquele momento, também não obtivemos retorno. O desprezo pelas tentativas de comunicação da Anepe é visto por nós com muita preocupação, pois são evidências do racismo institucional à ótica do cuidado”.
Apesar de tudo, a organização afirma estar aberta para conversar com o Governo de Pernambuco e com o secretário de saúde, André Longo.
*Dados sobre o processo de imunização no Nordeste e em Pernambuco tem como Fonte: Consórcio formado pelos veículos Folha, UOL, O Estado de S. Paulo, Extra, O Globo e G1 (atualizados em 7.abr.2021 – 23h14).
Foto de capa: Divulgação/AMNB.
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Quando criança, sonhava em ser escritora. Hoje, é graduada em Letras e Jornalismo pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP). Prêmio Neusa Maria de Jornalismo. Produtora cultural, simpática, TCC nota 10 e faz tudo.