Black Nordeste Maranhão

ONU cobra governo federal por violações à comunidade Piquiá, no Maranhão

Durante a 45ª Sessão Ordinária do Conselho de Direitos Humanos (CDH), que acontece nesta sexta-feira, 18, de modo híbrido – com audiências online e presenciais –, será apresentado o relatório que cobra violações de direitos humanos à comunidade Piquiá, em Açailândia, no Maranhão.

As recomendações presentes no documento, foram indicadas pelo então relator especial, Baskut Tuncak, em “Implicações da gestão e eliminação ambientalmente racional de substâncias e resíduos perigosos”, que visitou o local em dezembro de 2019.

A comunidade maranhense sofre há mais de 30 anos com poluições recorrentes, causadas pelas companhias de mineração e siderurgia, inseridas por meio do Programa Grande Carajás, implantadas pela empresa Vale.

Histórico de violações

Cerca de 310 famílias moram nesta comunidade: vivem sem saneamento básico ou calçamento nas ruas e ficam confinadas entre a rodovia BR-222, a ferrovia Estrada Ferro Carajás e os pátios das siderúrgicas. Com seus quintais cobertos por fuligem, os moradores denunciam que muitos têm problemas respiratórios, alergias e dores de cabeça.

A presidente da Associação de Moradores e Moradoras de Piquiá, Francisca Sousa Silva, destacou que, por conta da poluição e da morte do marido em decorrência de câncer de pulmão – que pode ter sido causado por estas impurezas lançadas pelas empresas instaladas no território -, mudou-se para a comunidade vizinha, com receio de ter o mesmo fim.

Questionada pela reportagem se as empresas oferecem algum tipo de suporte médico para os moradores, a presidente da Associação afirmou que não. “Na verdade eles falam que estamos mentindo dizendo que a terra não era deles. Falam que nós quem invadiu (sic) o terreno deles”, explicou ela.

Na falta de um local para descarte, os resíduos da proudção siderúrgica são despejados a céu aberto, drenados para os corpos hídricos, contaminando o riacho Quarenta, utilizado pela população local. Por causa das altas temperaturas destes sedimentos, há registros de três acidentes graves por queimaduras, além da morte de um garoto de oito anos que brincava com resíduos descartados sem proteção. 

Relatório da ONU

O então relator especial, Baskut Tuncak, visitou a comunidade de Piquiá e elaborou um relatório sobre os impactos das siderúrgicas naquela região. Ele apontou, em observação preliminar, que os moradores da comunidade sofrem com minérios de ferro nos quintais, e esta condição representa um atentado aos direitos daquela população. “Este é um dos casos mais audaciosos de um grupo empresarial que opera em total desrespeito aos direitos humanos e, ao mesmo tempo, a incrível história de uma comunidade que continua lutando”, afirmou.
 
O documento completo da visita será apresentado pelo chileno Marcos Orellana, o atual novo relator das Organizações das Nações Unidas (ONU) sobre gestão de substâncias e resíduos perigosos, que apresentará, na 45ª Sessão Ordinária do Conselho de Direitos Humanos, o parecer e as recomendações em relação aos problemas na comunidade, com base na pesquisa realizada por Baskut.

Luta pelo reassentamento

Em luta há 15 anos pelo reassatamento longe da contaminação pelas siderúrgicas, a presidente da Associação de Moradores e Moradoras de Piquiá, Francisca Sousa Silva, pontuou a importância desta cobrança ao governo brasileiro. “Vamos continuar na luta até o fim”, enfatizou a ativista. 

Em 2018, foi iniciada a construção do novo bairro “Piquiá da Conquista” que deve abrigar as 312 famílias da região. No entanto, o governo federal efetuou cortes significativos no programa Minha Casa Minha Vida, que dificultou a continuação das obras. 

Baskut Tuncak registrou que as ações do governo federal são importantes para atender à população da comunidade. “A tomada de ações urgentes pelo governo é necessária para garantir a continuação do programa Minha Casa Minha Vida, bem como contribuições consistentes e rápidas do governo e das empresas envolvidas, para atender aos desejos dos membros da comunidade, que optaram a serem removidos das condições de vida inquestionavelmente tóxicas, e os quais foram forçados a aguentarem por décadas ”, declarou. 

Além do caso de Piquiá, o governo brasileiro também será cobrado por medidas nos crime ambientais das cidades mineiras de Brumadinho e Mariana e a utilização indiscriminada de agrotóxicos no país.

Foto de capa: Vista da comunidade de Piquiá, no distrito industrial de Açailândia (MA). Casas de moradores dividem espaço com fábricas de ferro gusa ao fundo. Créditos: Fabíola Ortiz.

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