Atualizado às 23h25 do dia 28/05/2021
O médico branco que passou a compreender a subjetividade do paciente negro, sem dúvidas, evoluiu em seu profissionalismo. Isso porque nós, enquanto população negra, temos nossas demandas de saúde e, infelizmente, ainda não é tão possível encontrarmos profissionais negros em todas as áreas de saúde e especialidades da Medicina na mesma medida em que encontramos profissionais brancos. Infelizmente, são poucos os brancos que se esforçam para nos entender, eu diria. Nas minhas experiências, conheci apenas um. O psiquiatra que me atendeu nessa semana.
Nunca havia cogitado a possibilidade de precisar procurar um médico psiquiatra até que… 2021. É, está realmente difícil viver no Brasil esse ano sem adoecimentos e surtos. E está tudo bem em precisar procurar outros tipos de profissionais dentro da área da saúde, aumentando a sua rede e suas ações de autocuidado. “Seu autocuidado é a sua sobrevivência”, disse o psiquiatra que me atendeu quase ao final da consulta.
Foi uma das melhores consultas que eu já tive em toda a minha vida, posso dizer isso sem receios e arrependimentos. Semelhante a um outro dia em que eu fui atendida por uma ginecologista negra pela primeira vez. Como nós temos um “senso comum” e uma opinião “mal formada” sobre ir ao psiquiatra, eu torcia muito para que o profissional não fosse branco e me acolhesse bem. Já que entendemos ser uma seara delicada e um tratamento que merece bastante atenção.
Tive a sorte de encontrar um profissional branco empático, acolhedor e evoluído. Isso porque ele foi capaz e se prontificou a entender a minha subjetividade enquanto mulher e paciente negra. E a consulta não foi somente sobre prescrever um remédio para um tratamento psiquiátrico. Foi além, muito além. Já que ele conseguiu compreender que os meus processos de autocuidado e resistência diante da vida e do mundo são os que me salvam (A literatura é um deles, por exemplo). E, então, ele me ajudou a voltar a mim mesma, de certa forma.
De todo modo, é válido ressaltar que, obviamente, não foi a mesma experiência de ser atendida por um profissional negro. Nem provavelmente nunca será. E, definitivamente, seria muito o meu sonho e o de muitas pessoas negras encontrar um psiquiatra negro ou negra um dia. Mas, por enquanto, não foi possível. E que maravilha ter tido a sorte de encontrar um psiquiatra branco capaz de compreender a minha subjetividade negra. Assim, eu começo a acreditar um pouco nessa evolução que é tão necessária para nós, negros e negras. Já que queremos fugir de novas experiências violentas (e traumáticas) e também porque ainda não conseguimos encontrar profissionais negros em todas as áreas da saúde. Ainda não é tão possível escolher.
Foto de capa: Cottonbro/Pexels.
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Jornalista profissional (nº 4270/CE) preocupada com questões raciais, graduada pela Universidade de Fortaleza (Unifor). É Gestora de mídia e pessoas; Fundadora, Diretora Executiva (CEO) e Editora-chefe do Negrê, o primeiro portal de mídia negra nordestina do Brasil. É autora do livro-reportagem “Mutuê: relatos e vivências de racismo em Fortaleza” (2021). Em 2021, foi Coordenadora de Jornalismo da TV Unifor. Em 2022, foi indicada ao 16º Troféu Mulher Imprensa na categoria “Jornalista revelação – início de carreira”. Em 2023, foi indicada ao 17º Troféu Mulher Imprensa na categoria “Região Nordeste” e finalista no Prêmio + Admirados Jornalistas Negros e Negras da Imprensa Brasileira em 2023 e 2024. Soma experiências internacionais na África do Sul, Angola, Argentina e Estados Unidos.