Mulheres pretas devem ter maior protagonismo dentro das chapas que concorrerão nas eleições em 2020
Para subverter as estruturas político-partidárias postas. Nas próximas eleições municipais, o movimento de candidaturas coletivas negras deve se consolidar nas capitais do Nordeste brasileiro. As iniciativas surgem a partir de ligações partidárias, movimentos sociais, ativistas independentes e da periferia. A campanha exitosa da JUNTAS, em Pernambuco, à Assembleia Legislativa do Estado em 2018, influencia e serve como parâmetro aos postulantes à vereança nas cidades nordestinas.
Além do próprio Recife, berço político do modelo no Nordeste, o município Jaboatão, Região Metropolitana da capital pernambucana, deve ter chapa coletiva de mulheres negras à Câmara Municipal da cidade. Na capital, foi lançada no último sábado, 25, a candidatura Pretas Juntas na Política. O formato protagonizado por mulheres não-brancas deve refletir em outras agremiações. Em fevereiro, 60 pré-candidatas marcaram presença no Fórum Nordeste Mulheres Negras e Poder, que aconteceu no Recife e Olinda, conforme o Geledés.
Ceará
Em Fortaleza, Louise Santana, Adriana Geronimo e Lila M. Salu devem disputar vereança. Conforme Santana, para chegar ao “Nossa Cara”, nome da candidatura, ocorreram vários processos de formação. De início, outras companheiras estavam na expectativa de postular mandata coletiva. No entanto, por conta das demandas da vida, dos movimentos nos quais integram e das novas exigências oriundas da pandemia do novo coronavírus, as outras militantes não participarão.
Pedagoga e estudante de Direito na Universidade Federal do Ceará (UFC), Santana reconhece as limitações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e dos próprios partidos frente às candidaturas coletivas. É justamente com nesse cenário que o trio deve adentrar para diversificar o debate e representar os sujeitos-alvos de uma política sem a sua participação. Adriana Geronimo deve registrar a chapa Nossa Cara. Ambas são filiadas ao Partido Socialismo e Liberdade (Psol); Lila M. Salu, não.
“Não queremos estar lá só para performar. Queremos também financiamento partidário e político. Uma defesa intransigente das nossas bandeiras, queremos sim proteger crianças e adolescentes. Pautar uma política de segurança. Reconhecer que a política não pode matar os jovens na periferia. Que os movimentos de cultura e lazer tenham demarcação étnicas. Queremos o tempo de TV e exposição. Reivindicamos a própria publicidade que o partido nos dá”, demanda Santana.
No modelo político vigente, o vereador recebe sozinho o salário do mandato. Caso saiam exitosas, o montante será dividido igualmente entre as três. Santana e Salu devem ser contratadas como assessoras parlamentares enquanto Gerônimo é quem tem o compromisso de receber integral o valor a ratear. Além de Fortaleza, o Cariri cearense deve ser representado pelo Coletivo Sementes, que tentar emplacar a candidatura na região.
Bahia
As Pretas por Salvador também miram uma mandata coletiva. Laina Crisóstomo, Cleide Coutinho e Gleide Davis integram a chapa, sendo a primeira responsável pela inscrição junto ao TSE. Leina se orgulha da diversidade entre as participantes. “A gente precisa dá um bug no sistema porque o TSE e o TRE não sabem o que é isso. Estamos conseguindo fazer um enfrentamento. A Justiça não estava preparada para o tipo de luta. A justiça e o estado são extremamente coloniais”, acusa.
“A candidatura é de afeto e coletiva, de autocuidado e não sobrecarga. Porque a gente deve ocupar sozinha, se pode ocupar de bonde? Nossa luta passa pela luta feminista, mas também antirracista. Quando a pauta é coletiva, a gente consegue avançar muito mais. A gente pode fazer política sem que sair sobrecarregada ou adoecida”, espera Crisóstomo.
Individualmente, Laina e Cleide foram candidatas a deputada federal na última eleição. Ambas não tinham o entendimento sobre candidatura coletiva. “Não que eu tenha feito candidaturas sozinhas, mas é um processo adoecedor. você é a candidata pública, você tem de estar em todos os espaços. A partir de alguns olhares, em Pernambuco, a gente viu a possibilidade de construir uma candidatura não sobrecarregada”, diz Laina.
Laina faz parte de movimento de mulheres, da rede de ciberativistas negras nacional, comandado pelo Crioula no Rio de Janeiro, além do movimento de Advogadas sem tabu. Há quatro anos, criou a organização TamoJuntas para atender multidisciplinarmente mulheres em situação de violência. Hoje, a iniciativa está em 19 estados brasileiros.
Alagoas
Lá, a candidatura coletiva negra ainda não foi lançada, mas já está. É o que informa Geysson Santos, único pré-candidato anunciado. “Ainda está fechando a identidade da campanha, nome do mandato”. O preto lembra quando, pela primeira vez, concorreu coletivamente a deputado estadual em 2018. A candidatura, segundo ele, foi construída por fora do partido. Da mesma forma deve ser este ano. A diferença é que o grupo é formado apenas por pessoas negras.
Assim como em Maceió, uma candidatura coletiva negra deve ser lançada nos próximos dias no Piauí. A chapa deve pleitear vaga em Teresina.
Ilustração de capa: Suellem Cosme.
LEIA TAMBÉM: Lideranças cobram partidos por paridades entre negros e brancos nas eleições deste ano
Quase jornalista pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Além do Negrê, é repórter de Cidades do Grupo de Comunicação O POVO, cobre mobilidade, saúde, meio ambiente e outros, mas tem carinho pela Educação. Entre 2013 e 2015, cursou matemática na Universidade Estadual do Ceará (UECE). Nesse período, fez parte do projeto O Círculo da Matemática, programa de ensino para crianças da rede pública, iniciativa da Universidade de Harvard em parceria com o Instituto TIM. Também deu aulas de inglês para crianças durante intercâmbio na Colômbia.