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Por que homens negros estão conversando sobre Masculinidades?

Durante este mês de agosto, entre os dias 19 e 28, rolaram, no perfil do Instagram do Negrê, algumas lives sobre temas diversos, com pessoas igualmente diversas e potentes. Na última terça-feira, dia 25, Paulo Gonzaga, colunista do Negrê e psicólogo, e Rick Trindade, comunicólogo, produtor de conteúdo e uma das pessoas mais simpáticas do Black Twitter, conversaram um pouco sobre masculinidades negras. O vídeo da live na íntegra está salvo e disponível no IGTV do Negrê (Aproveita e confere as outras live também!).

O tema “masculinidades negras” tem sido assunto frequente entre os homens negros. Na internet, há muitas referências sobre o assunto (Pesquise! É importante!) e a temática vem, ao longo dos últimos anos, consolidando-se enquanto campo de estudo. Mas em linhas gerais, o que quer dizer “masculinidades negras”? E por que homens negros têm conversado tanto sobre isso?

Falar de masculinidades negras é falar sobre ser um homem preto dentro de uma sociedade estruturada pelo patriarcado e pelo racismo. É, portanto e sobretudo, falar sobre onde se localiza o homem negro dentro dessas estruturas.

“Quando a gente fala sobre masculinidades, a gente fala sobre um conjunto de atributos, comportamentos e características que a sociedade espera de um homem”, explicou o Paulo no início da conversa. É preciso pensar, no entanto, que essas construções históricas e sociais do que se entende por masculino foram feitas a partir de um perfil muito específico: o homem cis, hétero e branco

Essa ideia de homem viril, forte, violento, competitivo e conquistador, porém, não cabe em todos os homens. Algumas vertentes dos feminismos, inclusive, já vem falando há algum tempo sobre essas expectativas e pressões que são colocadas sobre os homens na esperança de que eles correspondam. 

A diferença aqui incide especificamente sobre uma dimensão: a da humanidade. Homens brancos, mesmo diante dessas pressões e mesmo quando não atendem às expectativas que são colocadas sobre eles, ainda são vistos como humanos. Isso não acontece com os homens negros. Estes são desumanizados em diversos lugares e de diversas formas. Falar de masculinidades negras, nesse sentido, é perceber que essa lógica do patriarcado atravessa homens racializados (no nosso caso, em específico, os homens negros) de uma outra forma e a partir de um outro lugar — o da violência da desumanização.

Seja na premissa de que somos agressivos, violentos ou de caráter/índole naturalmente questionável (tema de minha última coluna), seja na hipersexualização, o olhar que nos chega já um olhar de desumanização e animalização dos nossos corpos e do nosso ser. É um olhar que parte justamente da premissa de que o homem negro é um Negro* antes de ser um Homem, como apontou o psiquiatra, filósofo e ensaísta marxista Frantz Fanon (1925-1961), em “Peles Negras, Máscaras Brancas” (1952).

A importância do debate sobre masculinidades negras vem justamente da possibilidade que esse debate abre para pensar o ser homem em sua pluralidade, sem cair no equívoco de pensar o masculino como homogêneo. Dentro da experiência ocidental de patriarcado, por exemplo, os lugares reservados ao homem negro são o cárcere, o cemitério, as calçadas… Trata-se, portanto, de pensar que o patriarcado é uma estrutura que existe para beneficiar não todos os homens, mas especificamente o homem branco

Homens negros estão conversando sobre masculinidades tanto para denunciar a violência que a lógica patriarcal de poder e extermínio direciona aos nossos corpos como para afirmar a possibilidade de outras formas de viver as masculinidades (exato, no plural!). No fim das contas, é sobre reivindicar que sejamos percebidos enquanto humanos, condição que nos é negada, historicamente, há séculos, não importando o quanto nos adaptamos ao que se entende por padrões de masculinidade.

Nós precisamos humanizar nossas relações com/entre homens negros. Precisamos fortalecer redes de apoio. Precisamos falar sobre os nossos sentimentos, as nossas dores e as violências que sofremos. Nós, homens negros, precisamos de afeto — e é sobre essa necessidade que estamos falando.


* O termo “Negro”, pode ser entendido aqui a partir da definição de Achille Mbembe, mencionada em minha última coluna. Trata-se de uma construção ocidental, decorrente da colonização, onde o termo “Negro”, dentro do imaginário europeu, passou a ser associado a tudo que há de mais distante do “humano”, do “racional” e do “civilizado”. O “Negro” é, portanto, o irracional, o agressivo, o perigo, o animal.

Foto de capa: Project 290/Unsplash.

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