Dizem que a casa da gente é o melhor lugar do mundo, por representar pertencimento, segurança e acolhimento. No longa-metragem inglês His House (2020), que no Brasil recebeu o título de O Que Ficou Para Trás, do diretor Remi Weekes, a residência pode trazer lembranças e espíritos que não deveriam estar ali. Mas será que essa casa é realmente mal assombrada ou seus moradores estão psicologicamente aterrorizados e se sentindo culpados?
Seguindo a tendência de utilizar situações cotidianas reais para criar filmes de terror, assim como a série recente da HBO, Lovecraft Country (2020), O Que Ficou Para Trás opta por utilizar uma das maiores mazelas do século: a imigração ocasionada pelo horror das guerras civis. O filme conta a história do casal de imigrantes Bol (Sope Dirisu) e Rial Majur (Wunmi Mosaku), que fugiu da guerra no Sudão do Sul para se refugiar no Reino Unido. Após passar meses na detenção em Londres e perder a filha em alto mar, eles aguardam asilo no país europeu.
A difícil travessia do casal e sua filha Nyagara (Malaika Wakoli-Abigaba) é apresentada logo no início do filme, mas não completamente. Por meio de flashback, acompanhamos as dificuldades de conseguir um transporte seguro para chegarem ao mar, de onde terão que atravessar em pequenos botes com um sem número de pessoas, muito mais do que regularmente seria permitido.
Apesar dos riscos da travessia, o casal acredita que a única maneira de sobreviverem é tentar. Assim como muitos imigrantes de diversos países que acompanhamos diariamente nos noticiários, eles querem apenas sobreviver longe da guerra e do massacre. Na travessia, um acidente faz o barco virar e a maioria dos refugiados acaba morrendo, inclusive Nyagara, que não sabe nadar. Bol e Rial são os sobreviventes resgatados com vida.
O primeiro momento de felicidade acontece quando finalmente eles serão transferidos da detenção para uma residência cedida pelo governo inglês, o que ainda não lhes garante a permissão para ficar no país, pois, durante alguns meses, eles serão avaliados pelo agente Mark (Matt Smith), e qualquer erro pode colocá-los em risco. Ao chegar na casa, se deparam com um local inóspito, sujo e descobrem que a vizinhança, majoritariamente branca, não é receptível com a presença de negros e/ou refugiados.
Além de todo o enfrentamento que se submeteram até chegar a salvo no país e a opressão racial e xenofobia dos vizinhos, o casal terá que conviver com uma ameaça espiritual que está trazendo fantasmas do passado para atormentá-los.
O casal acredita que vê a imagem da filha pela casa. Para além da casa mal assombrada, os moradores estão psicologicamente aterrorizados pela culpa. Bol está fixado à ideia de permanecer no país, custe o que custar. Enquanto, Rial tenta convencê-lo a voltar para o Sudão.
Eles acreditam que estão sendo perseguidos por um apeth (bruxo da noite), uma entidade obsessiva que atormenta quem ousa roubar algo dele. Acreditamos que Bol e Rial não são criminosos, que não roubaram nada. Será? Sem mais spoilers, o que podemos dizer é que a culpa é o que move o filme e os terrores a que os moradores são submetidos.
A obra une várias questões que por si já seriam um bom mote para um filme de terror, como o racismo da vizinhança e dos próprios assistentes sociais, o trauma da travessia do Sudão até o Reino Unido e os riscos de serem massacrados ainda em seu próprio país. O terror psicológico é tão assustador quanto o sobrenatural.
Ficha Técnica
O Que Ficou Pra Trás
Ano: 2020
País de Origem: Reino Unido
Duração: 1h 33min
Gênero: Suspense, Terror, Drama
Direção: Remi Weekes
Roteiro: Remi Weekes
Obra original: Felicity Evans, Toby Venables
Elenco: Wunmi Mosaku, Sope Dirisu, Matt Smith, Malaika Wakoli-Abigaba
Disponível: Netflix
Foto de capa: Divulgação/Netflix.
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Formada em Jornalismo e com especialização em mídias digitais, a baiana tem dedicado sua carreira ao mercado audiovisual há oito anos, quando iniciou na área. Já atuou como produtora executiva em obras para a televisão e em diversas funções dentro da produção de uma obra. Apaixonada por filmes e séries, se considera uma viciada que assiste mais de seis obras por semana.