O programa Diáspora Conecta, comandando pelo Diáspora Lab, vai premiar num valor de R$ 10 mil reais cineastas e roteiristas negros com projetos em andamento. As inscrições vão até o próximo sábado, 15, e o vencedor do melhor projeto ganhará uma viagem para Espanha em 2021.
A presença dos negros no audiovisual brasileiro é muito pequena em comparação aos brancos. Os dados da pesquisa Diversidade de gênero e raça nos lançamentos brasileiros de 2016, divulgados pela Agência Nacional do Cinema (Ancine) em 2018, ilustram essa disparidade. O programa Diáspora Conecta propõe romper essa dura estatística.
O estudo aponta que nos filmes produzidos no ano em análise os negros representam apenas 13,3% do elenco. Na direção, os homens negros figuram 2,1% seguido de 0% da presença das mulheres negras a frente das realizações. Já no tocante ao roteiro só 2,1% e 0% das mulheres negras. A Ancine analisou 142 filmes nacionais que chegaram ao circuito comercial em 2016.
A empreitada é centrada em duas categorias: roteiro e produção. E os laboratórios começam a ocorrer no próximo dia 6 de outubro e vão até 26 de novembro, de maneira online. E conta com as consultorias das cineastas: Joelma Oliveira Gonzaga e Paula Gomes (Brasil), Tanya Valette (República Dominicana) e Xenia Rivery (Cuba). O melhor projeto ganhará uma viagem com tudo pago para participar do Fórum de Coprodução África – América Latina (AFROLATAM LAB) por meio do prêmio Mirasasdoc.
Condições
Para conseguir participar do programa é necessário ter mais de 18 anos, ser negro ou negra e residir no Brasil, além de ter algum projeto de longa-metragem de ficção ou de documentário em fase de desenvolvimento.
O Diáspora Lab Roteiro irá selecionar até seis projetos de longa-metragem em fase de desenvolvimento, três de ficção e três na categoria documentário. A iniciativa focaliza em roteiristas com paixão pelo cinema.
No caso do Diáspora Lab Produções, quem foi selecionado na última edição não poderá participar na edição deste ano. Além de ser necessário ter produzido ao menos um longa-metragem, ou dois curtas-metragens, ou uma série para televisão, de ficção ou documentário, como produtor/a principal. A proposta é voltada para o aprimoramento das habilidades criativas de produtores negros e negras independentes.
Resultado
A seleção acontecerá em duas etapas. Primeiro, será divulgado o resultado da pré-seleção do programa no próximo dia 20 de setembro. Segundo, entre os dias 21 e 24 de setembro, acontecerá uma série de entrevistas com os pré-selecionados. O resultado final será divulgado no dia 25 de setembro.
Cineastas negros
O escritor e realizador cinematográfico (AL) Lucas Litrento assina o roteiro e a direção do curta Samuel foi trabalhar, com Janderson Felipe, que está em fase de produção. Litrento conversou com a reportagem a respeito do edital do Diáspora Conecta e afirmou que os artistas negros estão envolvidos no cinema brasileiro desde sempre.
“O lance é o seguinte: quanto mais negro é o filme (no sentido de ter produtores, realizadores, elenco e linguagem negros) mais independente é essa obra. Geralmente é assim. O cinema negro é independente, não existe uma cultura de produção em grande escala, as coisas estão mudando agora. Então esse tipo de edital, que fomenta as ideias, que dá uma gás na produção, é muito importante. Sem dúvidas, precisamos nos agarrar e preencher esses espaços”, aponta.
O estudante de Jornalismo e realizador cinematográfico Janderson Felipe falou à reportagem sobre o espaço do negro no cinema nacional e em Alagoas.
“Apesar de conhecermos figuras históricas como Grande Othelo e Zózimo Bulbul e adiciono até a Adélia Sampaio, a primeira mulher negra a dirigir um longa em circuito comercial, o epistemicídio é uma marca constante da história do cinema negro. Por exemplo, aqui em Alagoas, não sabemos quem é nosso o/a primeiro realizador(a) negro, o que faz parecer que a gente sempre tá começando. Então, existe uma lacuna enorme para se investigar da participação negra no cinema alagoano”, disse.
Felipe atribui a falta de um marco da presença do negro nas produções audiovisuais alagoanas justamente por não existir muitos dados e pesquisas sobre o assunto no estado.
“Infelizmente, isso é uma marca do cinema negro brasileiro, não é uma especificidade apenas do nosso estado, e não só do cinema. Nisso o que se dá pra dizer é que existe uma participação negra no cinema alagoano mais contemporânea, como os filmes Mwany de Nivaldo Vasconcelos, o Ilhas de Calor do Ulisses Arthur, o Angelita da Jéssica Conceição e Mare Gomes e o mais recente Cavalo, de Rafhael Barbosa e Werner Salles, um filme com uma grande participação negra no elenco e o primeiro longa-metragem alagoano através de financiamento público. Porém, ainda é difícil dizer que exista uma cena de cinema negro em Alagoas, talvez exista um início de diálogo com esse cinema aqui e que só mudará de fato com a participação de pessoas negras dentro de toda a estrutura de produção do nosso cinema”, concluiu.
Foto de capa: Ladiwayne Grafix/Pexels.
É Jornalista e escritor. Morador da periferia. Autor de “Os deuses estão embriagados de uísque falsificado” (Sirva-se edições alternativas – Oxenti Records, 2019). Vencedor dos prêmios: IV Concurso de Poesias Jorge de Lima, Secult – AL – 2018, Arte como Respiro, Itaú Cultural – 2020. Editor do site: O que os Olhos Não Veem. Estudante de Letras – Português, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Acredita no jornalismo independente, pautado pela diversidade e pelos direitos humanos.