Piauí

Sexta Nagô: movimento de fortalecimento da negritude piauiense

Sexta Nagô foi o nome escolhido pelo grupo de cultura Afro Afoxá (GruCAA) para intitular os eventos voltados para o fortalecimento da negritude piauiense. A iniciativa surgiu a partir da inquietação do coletivo com a falta de espaços para compartilhar a cultura do povo preto em Teresina, capital do Piauí. Com mais de 20 anos de atuação, o grupo tornou-se um espaço educativo que abrange diversidade de práticas, envolvendo culinária, artes visuais, música, estética e dança afro ancestral como elemento de atração de força, conhecimento, luta e engajamento em reivindicações política ao longo desses anos. 

A história da Sexta Nagô se mistura com a reformulação do Memorial Zumbi dos Palmares, importante espaço de valorização da cultura negra no Estado. O prédio que antes funcionava a Escola Estadual Domingos Jorge Velho, em alusão ao bandeirante responsável pela expedição que destruiu o Quilombo dos Palmares em 1695, mudou de nome e de objetivo como reparação histórica à violência sofrida pelo povo negro. A mudança, ocorrida oficialmente em julho de 2007, foi fruto da luta do movimento negro piauiense. 

Com a ausência de um espaço que promovesse encontros de valorização da cultura negra no Estado, o Afoxá ocupou, culturalmente, o Memorial sete anos depois. A ideia surgiu após um primeiro encontro dos grupos Afros de Teresina (Movimento pela Paz na Periferia – MP3, Condarte, Coisa de Nêgo, entre outros) com o objetivo de realizar uma avaliação das relações internas do movimento negro da época e criar um planejamento em comum. Um dos planos foi a ocupação do Memorial. Depois desse contato entre grupos afros, foram realizados mais alguns encontros, outros foram adiados e acabaram não acontecendo. Assim, o Grupo Afoxá resolveu seguir o caminho sozinho.

Memorial Zumbi dos Palmares
Foto: Jailson Soares

A partir desse momento, o grupo Afoxá concretizou várias ideias, sendo a principal delas a organização de espaços culturais no Memorial. Foram instituídos uma sala de exposição e comercialização de roupas, telas, esculturas, bijuterias e vários outros produtos, confeccionados pelos grupos ou por pessoas negras afrodescendentes, uma sala para exposições temporárias e instalações. Além de outras formas artísticas sobre a temática política afrodescendente, uma sala para exibição de vídeos e debates, conhecida como Tela Nagô, a biblioteca pronta para visitações, salas de aulas para que pudessem ser ensinadas oficinas de percussão, dança, línguas nativas da África, a exemplo do iorubá (idioma da família nígera-congolesa). Assim, gradativamente, foi se utilizando o espaço do Memorial de Zumbi dos Palmares em eventos culturais que aconteciam todas as sextas feiras, dando vida à Sexta Nagô. Com o passar do tempo, foi criado o coletivo Zumbidos do Memorial, com as pessoas que contribuíam com as sextas nagôs: membros do Afro Afoxá, o movimento do Reggae teresinense, Grupos de Rap, estudantes das universidades públicas da capital, entre outros grupos. O coletivo é o responsável pela manutenção da Sexta Nagô viva até hoje.

Sexta Nagô em apresentação de dança
Foto: Reprodução/Facebook

A primeira Sexta Nagô

O primeiro Sexta Nagô aconteceu mais precisamente em 21 de março de 2014, data em alusão ao Dia Internacional de Luta contra o Racismo. Para Artenilde Silva, coordenadora geral do grupo Afro Afoxá, o evento foi especial para a comunidade preta teresinense: 

“Foi excepcional! Tivemos um grande público e bom retorno da mídia, nossa exposição temporária, a biblioteca, os grafites no muro feito por grafiteiros da quebrada, o espaço estava em permanente processo de construção, idealização e manutenção. Foi feito e mantido pela negritude da periferia, que havia se apropriado do espaço, como seu de legítimo direito reparatório, tenho orgulho”, diz.

Assim, com o passar do tempo, o público das Sextas Nagô foi aumentando, o projeto tomando forma e sendo feito por construção coletiva. Apesar de não terem apoio efetivo do Estado, o coletivo conseguiu uma parceria importante com a Universidade Estadual do Piauí (UESPI), apoio que permitiu a realização de cursos e rendeu um segundo espaço para o coletivo, dentro de uma universidade pública. 

Em 2015, quando o então deputado estadual Fábio Novo tomou posse da Secretária de Cultura do Piauí foram feitas reivindicações de reforma no Memorial de Zumbi dos Palmares. O prédio foi transformado em um novo espaço e passa a ser o Memorial Esperança Garcia. Este momento gerou um forte golpe ao Sexta Nagô que teve parte de sua liberdade de idealizações dos eventos paradas de forma gradativa. No ano seguinte, o coletivo realizou seu último evento no espaço do memorial e, atividades que eram realizadas todas as sextas, passaram a ser realizadas em outros espaços. Em datas comemorativas de forma esporádica.

A última Sexta Nagô realizada presencialmente, aconteceu em fevereiro de 2020 no bairro Angelim I, sede do Afro Afoxá em Teresina. Em razão da pandemia da COVID-19, o Sexta Nagô está realizando alguns projetos onlines com objetivo principal de dar apoio aos artista de rua e outras temáticas que estão em risco devido ao atual momento. 

Flyer do último evento
Foto: Reprodução

Para Marcus Sousa, responsável pelas artes visuais e setor cultural da Sexta Nagô, o objetivo futuro do grupo Afoxá é realizar o evento a cada bimestre, em um período de um ano e depois disso levar a proposta para outros bairros da capital piauiense. Depois em outros municípios do Piauí e partir para outros estados do nordeste brasileiro.

“O nosso objetivo é de formação e fortalecimento da negritude com os seus fazeres e saberes, de atrair negras e negros para a olharem para si mesmo, seus valores pessoais e culturais e acima de tudo reconhecer o seu potencial de transformação”, declara.

A Sexta Nagô, além de construir uma rede de parcerias com grupos e pessoas afrodescendentes em maior espaço territorial possível, ela também é um instrumento político de denúncia dos descasos enfrentados pela comunidade afrodescendente em território brasileiro.

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