“É preciso dominar a sua área de atuação, se qualificar, conhecer os processos e fluxos de base, ter coragem para desbravar o desconhecido e exercitar a resiliência. É preciso acreditar na mudança, ter firmeza para lidar com a resistência e flexibilidade para dialogar. Não há nenhum avanço sem construção coletiva”. É o que diz Helena Barbosa, 34, superintendente do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura de Fortaleza (CE) para mulheres negras que almejam construir uma carreira dentro de locais de gestão, poder e liderança.
Em sua trajetória, a cearense Helena Barbosa acumula vivências em seu caminho acadêmico e profissional como gestora cultural, produtora e pesquisadora. Ela é graduada em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Ceará (UFC) com pesquisa nas áreas da Antropologia Visual, Cultural e Política e é Especialista em Gestão e Políticas Culturais pela Universidade de Girona/Itaú Cultural. E é também Especialista em Gestão Cultural Contemporânea: da ampliação de repertório à construção de equipes colaborativas pelo Instituto Singularidades/Itaú Cultural.
Em movimento desde sempre, Helena é autora do livro “Se essa rua fosse minha: narrativas verbais e visuais do Vicente Pinzón”, publicado em 2018, e da pesquisa “Entre a espada e o encantamento: o uso do índice de convivência intercultural”, no Instituto Dragão do Mar. Na área da administração e gestão pública, foi coordenadora dos Pontos de Cultura na Secult Ceará (2013), gerente de Ação Cultural no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (2017), Diretora de Formação e Criação no Instituto Ecoa (2019), assessora do Gabinete da Secult Ceará (2021) e gestora executiva no Centro Cultural Porto Dragão, equipamento da Secult Ceará, gerido em parceria com o Instituto Dragão do Mar (IDM).
Helena Barbosa completa seis meses de gestão no cargo de Superitendência Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura. E a equipe do Negrê conversou com a gestora cultural sobre mulheres negras em cargos de gestão e liderança. Confira!
Negrê – Como a liderança chegou na sua vida? Foi algo que esteve sempre presente na Helena criança, adolescente, jovem e adulta?
Helena Barbosa – Talvez a pulsão de convocar para a resolução. Esse processo de apresentar solução me inseria num lugar de importância. Estava sempre ocupando um lugar de servidão. Entendia que isso era uma linha comum social. Após o letramento racial, percebi que essa era a forma de várias mulheres negras encontrarem o afeto: por meio da serventia. Portanto, essa pulsão para resolução, inicialmente, não tinha qualquer relação com linha de frente. Eu produzia conhecimento, mas não explanava minhas palavras no palanque. Escrevia projetos, mas não assumia o microfone para apresentá-lo. Sempre tive o ímpeto para a formulação, mobilização e produção de ideias, mas ocupar a linha de frente desta narrativa é algo bastante recente.
N – A gestão e liderança na área cultural e social sempre foi uma vontade sua? Como esse setor te seduziu e chamou atenção?
H.B. – Meu encanto iniciou quando, em busca do primeiro emprego, me inscrevi em um curso de Produção de Vídeo da ONG Encine, quando a formação me trouxe conhecimentos sobre roteiro, fotografia, áreas técnicas, antropologia, filosofia e, ao final, oportunizou um estágio em um programa de TV. Me apaixonei por Audiovisual e por Antropologia, então ingressei na graduação em Ciências Sociais, tentando combinar essas duas paixões ao interesse pela Gestão Pública.
N – As empresas e organizações em geral estão preparadas para capacitarem e terem mulheres negras como líderes e gestoras nos dias de hoje? Por quê?
H.B. – Ainda somos poucas, mas já houve um certo avanço. É preciso apostar e ampliar as possibilidades de atuação. Reconhecer as dívidas históricas com a mulher negra, em particular, oportunizando essas ascensões no mercado é algo fundamental. Representamos a maioria do povo brasileiro, mas mulheres negras em posição de poder ainda são minoria. O Brasil é um país racista e machista.
N – Ao final do dia e diante de todas as violências que uma mulher negra enfrenta e, ocupando um local de poder, como se cuidar, como se olhar? Como se curar e se preservar para não se sentir destruída?
H.B. – Acredito que algumas coisas são fundamentais nessa rede de cuidado: ir sem fantasia, não romantizar as relações e traçar uma leitura racional (conceitual e técnica) da cena. Compreender que é uma estrutura de poder e que, portanto, é fundamental ter o discernimento dessa dinâmica. Para além disso, é preciso erguer um lugar seguro, com pessoas que respeitam suas trajetórias, sua liderança e sua construção. Um lugar seguro onde é possível, inclusive, errar.
N – O que você diria para outras mulheres negras que almejam construir uma carreira dentro desse lugar de gestão, poder e liderança?
H.B. – É preciso dominar a sua área de atuação, se qualificar, conhecer os processos e fluxos de base, ter coragem para desbravar o desconhecido e exercitar a resiliência. É preciso acreditar na mudança, ter firmeza para lidar com a resistência e flexibilidade para dialogar. Não há nenhum avanço sem construção coletiva. Foi nas ruas do Castelo Encantado e Mucuripe que compreendi que a coletividade é o princípio máximo da tecnologia da sobrevivência.
Foto de capa: Luiz Alves.
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Jornalista profissional (nº 4270/CE), preocupada com questões raciais, e graduada pela Universidade de Fortaleza (Unifor). É Gestora de mídia e pessoas; Fundadora, Diretora Executiva (CEO) e Editora-chefe do Negrê, o primeiro portal de mídia negra nordestina do Brasil. É autora do livro-reportagem “Mutuê: relatos e vivências de racismo em Fortaleza” (2021). Em 2021, foi Coordenadora de Jornalismo da TV Unifor. Em 2022, foi indicada ao 16º Troféu Mulher Imprensa na categoria “Jornalista revelação – início de carreira”. Em 2023, foi indicada ao 17º Troféu Mulher Imprensa na categoria “Região Nordeste” e finalista no Prêmio + Admirados Jornalistas Negros e Negras da Imprensa Brasileira. Soma experiências internacionais na África do Sul, Angola, Argentina e Estados Unidos.