Primeira poetisa a recitar poesias no palco do Marco Zero de Recife (PE) na abertura do Carnaval de 2024, a multiartista Luna Vitrolira está lançando o segundo livro da carreira, chamado “Memória tem Águas Espessas”. A obra trata sobre a ancestralidade canavieira da autora, a partir de uma experiência imersiva na Zona da Mata de Pernambuco.
“O livro é uma parte apagada da minha história e vida sobre a qual nunca tive conhecimento ou contato. Escrevo sobre o peso do sentimento de não ter família, nem passado, o que é comum na vida das pessoas brasileiras devido ao processo de colonização e ao sistema escravocrata que dispersou a genealogia do povo preto e dos povos originários”, conta.
Em “Memória tem Águas Espessas”, Luna questiona a existência, ainda nos dias de hoje, do sistema colonial na cultura da cana-de-açúcar na Zona da Mata. “O racismo no Brasil faz parte do projeto político hegemônico de dominação e extermínio de povos não brancos, que dentre suas estratégias estão o apagamento étnico-estético cultural, o silenciamento e a invisibilidade do povo que vive em exílio dentro do território do país que lhe confere nacionalidade”, explica.
Conexão com os ancestrais
Além dos questionamentos, a obra de Luna Vitrolira perpassa pelo trajeto de volta ao território ao qual pertence e possui ancestralidade, como forma de libertação dos antepassados que sofreram em meio à sociedade colonial da qual fizeram parte.
“A memória é a base e o princípio da história de um indivíduo ou indivídua, do povo ou comunidade. Sem ela não existe o tempo, seja passado, presente ou futuro. E isso se torna mais severo quando estamos falando de uma população que foi ceifada da convivência com os parentes, da relação com o sagrado e também da possibilidade de dizer e contar a partir de suas narrativas. Além disso, existe o sofrimento com o epistemicídio, a necropolítica, e, sobretudo, com a falta de pertencimento ao mundo devido à ausência de referência de origem familiar”, reflete a autora.
“Acredito que o livro ‘Memória tem Águas Espessas’ contribui para a representatividade na Literatura Brasileira Contemporânea, destacando a importância da poesia enquanto espaço criativo, artístico e político para a construção de uma literatura e uma estética de pertencimento para povos não brancos desse território”, afirma.
Sobre a autora
Luna Vitrolira tem 31 anos de idade. É poetisa, cantora, escritora, compositora, atriz, performer, pesquisadora, apresentadora, educadora, licenciada em Letras/Língua vernácula pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e Mestra em Teoria da Literatura, também pela UFPE. Ao todo, são 13 anos de carreira na poesia, além de experiências como palestrante e professora de Literatura Brasileira e de escrita criativa.
Com o livro de poemas “Aquenda: o amor às vezes é isso” (2018), lançado pelo Selo Livre, ela foi finalista do Prêmio Jabuti em 2019, com destaque na crítica nacional. Após o lançamento, a artista gravou o primeiro disco de mesmo nome, pelo Selo Deckdisc, iniciando a carreira musical em 2021. Com dez faixas autorais, o álbum reúne poesia e música. Ainda em 2021, lançou um filme curta-metragem homônimo.
Foto de capa: Estúdio Orra.
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