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Iansã e as mudanças trazidas pelo valor próprio

No reino de Oyó, a orixá Iansã era conhecida por sua beleza, bravura e poder sobre os ventos e tempestades. Casada com Xangô, o rei guerreiro, Iansã vivia em harmonia com as outras orixás e o povo de Oyó.

Mas a paz logo foi abalada. Ogum, deus da guerra, tomado por ciúmes do poder e da beleza de Iansã, decidiu desafiá-la em um duelo. A batalha foi épica, com raios e trovões iluminando o céu enquanto os dois orixás se enfrentavam. Iansã, com sua fúria implacável, dominou Ogum, demonstrando sua força e poder como guerreira.

Xangô, ao presenciar a fúria de Iansã, ficou aterrorizado. Ele nunca a havia visto tão enraivecida e temeu por sua própria segurança. Cego pelo medo e pela insegurança, Xangô expulsou Iansã de Oyó, condenando-a ao exílio.

Foto: Imagem gerada por Inteligência Artificial (IA) no site Canva.

Desolada e humilhada, Iansã vagou pelo mundo, buscando um lugar para se abrigar. Ela foi acolhida por outras orixás, que a consolaram e a ajudaram a recuperar sua força. Com o tempo, Iansã aprendeu a controlar sua fúria e a canalizá-la para o bem.

Em seu exílio, Iansã se tornou ainda mais poderosa. Ela dominou os segredos da magia e da alquimia, aprendendo a usar seus poderes para proteger os necessitados e punir os injustos. Sua fama se espalhou por todo o mundo, e logo ela se tornou conhecida como a “Guerreira de Fogo”.

Anos se passaram, e Xangô, arrependido de sua atitude, implorou o perdão de Iansã. Ela o perdoou, mas recusou-se a retornar a Oyó. Iansã havia encontrado seu próprio caminho e se tornado uma orixá ainda mais poderosa e independente.”

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Nosso primeiro lar.

Nosso berço familiar é um pedaço muito confuso de coisas. Nele, descobrimos nossas primeiras emoções, nossos primeiros laços e afins. Depois deles, temos a escola e os primeiros coleguinhas de fora da sala de aula. Conforme mudamos, começamos a ter nossos primeiros conflitos e, vamos aos poucos, evoluindo e aprendendo com tudo o que vivemos nessa primeira fase.

Considero importante darmos um zoom agora nesse quadro da nossa vida, até uns 10 anos de idade. Eu tive o privilégio de morar em um lar com pai e mãe, ambos empregados e com considerável sucesso em suas respectivas áreas. Mesmo assim, tive dificuldades ao sofrer com o racismo e lidar com regras que eu nem imaginava que pudessem existir.

Validação jurídica e outros conceitos complexos nem passavam pela minha cabeça em minha infância. Então, racismo e preconceito eram simplesmente, parte do meu cotidiano e eu, jovem cearense e negro, deveria aprender a lidar com isso com uma arma apenas: bom humor. Neste momento, eu reflito, calmamente por um instante: e as pessoas que aprendem a lidar com isso com violência?

Esse questionamento de hoje me fez perceber como é complexa a realidade do jovem brasileiro que sofre com a sua latente raiva de ser perseguido; escorraçado, difamado e precarizado pela sociedade como um todo. Ouve nas propagandas dos mais diversos charlatões que: “Você não consegue por que não quer ou por que não faz direito!”. Como não querer explodir tudo, se tudo que você ouve lhe implode?

Sim, eu entendo Iansã e sua raiva. Receber um desafio diante de motivações tão pequenas é a gota d’água muitas vezes necessárias para toda a raiva contida para fora! Explodir (ou surtar), é a forma que temos de transbordar de uma emoção destrutiva como a raiva! Isso gera medo em todos que esperam a subserviência, esforços sobre humanos, desumanização e baixa estima de pessoas negras.

Entenda esse ponto que é emblemático para o entendimento deste tema: UMA PESSOA EXPLODIR EM SEUS MAIS DIFERENTES AMBIENTES, ARRISCANDO ASPECTOS FINANCEIROS, PESSOAIS, RELACIONAIS E SAÚDE, ELA ESTÁ EM UM CENÁRIO DE DESESPERO.

Qualquer ação tomada em desespero surpreende. E as pessoas que sentem medo, assim como Xangô, temem por sua segurança e se desfazem do que é visto por eles como problema… O exílio é um período de molde, ele traz consigo muita dor! Torcemos nossas mentes e quebrantamos nossas almas em busca de nós mesmos. Essa dor é maior o quão mais distantes estamos de nós. Iansã que agora estava longe do que a moldou por tanto tempo, agora sofria para moldar a si.

Vagando e se transformando, Iansã consegue encontrar um novo lugar! Neste lugar, ela se encontra agora como guerreira mas também como aprendiz. Ela aprende como lidar com a sua fúria (explosão) e utilizá-la para o bem. Quando em seu conto, lemos sobre a alquimia das coisas; imagino que Iansã aprendera a lidar com suas emoções de outra forma, podendo equilibrar o balanço alquímico do que ela sente. O equilíbrio nos mostra novas possibilidades de escolha com liberdade.

Por meio de construções autênticas de nós mesmos nos diferentes âmbitos de nossas vidas (nosso lazer, nossos estudos, nossas relações e nossos interesses), podemos reluzir aquilo que há de beleza em nós mesmos e valorizar isso. Entendam que apesar de toda a beleza que Iansã já tinha antes de melhorar a si, ela ainda fora exilada. Logo, para que nenhum exílio de terceiros seja doloroso demais, dê atenção a si e acolha a atenção dos seus círculos mais internos.

Assim, sem desespero você pode transformar em não o sim que um dia você deu. O que torna a certeza de terceiros, o potencial de transformação deles de agora.

Foto de capa: Imagem gerada por Inteligência Artificial (IA) no site Canva.

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