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Sobre pensar e compreender a autoestima negra

“Uma das formas de exercer autonomia é possuir um discurso sobre si.”

Neusa Santos (1948-2008)

Olha, eu não sou uma pessoa que gosta de burlar regras. Na verdade, eu odeio esse lugar. Por isso, amo propor conversas interessantes com as pessoas. Diálogos que possam propor novas coisas e levar uma discussão interessante as pessoas, sempre com a intenção de promover crescimento.

Então, no decorrer do ano, irei trazer alguns temas que podem ser bastante interessantes de nós dialogarmos por aqui. Não irei enrolar com o primeiro pois acho que muito se tem para falar, então vamos começar com a autoestima!

Primeiro vou constatar algumas diferenças importantes:

  1. Autoestima não é a mesma coisa para todo mundo, traumas podem influenciar diretamente nisso;
  2. Como a autoestima faz parte de uma construção social, não estou aqui para julgar mas para trazer conceitos importantes para que você pense na sua;
  3. Não vou dizer quem você é ou como descobrir sua autoestima em passos, então preste atenção em como você se sente enquanto lê.

Para se estimar, existe uma infinitude de valores e compreensões que podem fazer toda a diferença em um estilo de vida saudável. Aqui irei falar sobre alguns dos tópicos mais importantes sobre tudo isso, como por exemplo: Sabe aquelas perguntas de RH que você ouve em muitas entrevistas: “Quais seus pontos fortes e quais os pontos a melhorar?”. Pois é… Essa pergunta muito tem haver sobre sua autoestima. Saber olhar pra si e reconhecer seus pontos fortes ou fracos ajuda muito a validar aquilo que você sabe fazer, tem a melhorar e que não gosta de fazer (Saiba que esse último é um dos mais importantes de se reconhecer).

Foto: Polina Tankilevitch/Pexels.

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Proscrastinação

Reconhecer seus pontos fortes demonstram sua possível zona de conforto e desenvolvimento. Queridos(as/es) que se consideram procrastinadores, entendam que procrastinar é um outro problema que nem sempre afeta pessoas confiantes! Existe um equívoco enorme que é confundir procrastinação com habilidades inatas ou confortáveis. Eu tinha um grande amigo nos tempos de escola que ele dormia nas aulas, jogava boa parte do dia, parecia que nem se importava muito com as coisas em geral. Ele estudava as vésperas da prova e conseguiu obter boas notas durante a vida toda e passou de primeira no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).

Muita gente pode dizer que ele procrastinava, eu digo que ele era um gênio! O cara conhecia tão bem as habilidades dele que ele não se importava com o prazo, ele sabia que ia obter o resultado com um esforço consideravelmente menor que o das outras pessoas. Então, nem sempre você é um procrastinador; às vezes você é só incrível de uma forma que as pessoas não julgam normal para elas, sem esse reconhecimento você vai acreditar no julgamento dos outros e sofrer miseravelmente com a culpa. Ao reconhecer seus pontos fortes e desafiar seu desempenho, você pode ter uma vida bem mais significativa e desprendida de compromissos sem sentido.

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Um relato meu

Agora, vamos a uma mudança de paradigmas! Vou trazer um relato meu. Eu trabalhava com análise de qualidade quando trabalhava com Computação; o tempo foi passando e eu via que não era valorizado em uma empresa, decidi mandar currículos. Quando mandei, decidi subir o meu valor de forma absurda e a outra empresa queria me pagar. Eu lembro muito bem do desespero e do prazer que senti naquele momento:

– Desespero de me sentir idiota por não me valorizar;

– Prazer de saber que eu valia aquilo tudo com meu conhecimento.

Depois desse dia, eu entendi que era muito importante eu saber olhar pra mim e saber me dar o meu valor! Isso afetou BAS-TAN-TE a minha forma de ser como psicólogo e empreendedor.

Agora o ponto ferrenho: mas isso funciona para pessoas pretas? Gente, posso lhes dizer que funciona, mas precisamos de mais espaços para que isso possa florescer de forma ampla. Afinal, uma das coisas que afeta a nossa autoestima partem da nossa forma de perceber a realidade, o que não é uma realidade fácil se você é negro e brasileiro. Nossa realidade é muito cheia de clichês: “Preto tem que trabalhar duas vezes para receber de um”, “Preto só sobe na vida quando o barraco explode”, “Não há outras pessoas como você por aqui”, etc.

Foto: Joshua Mcknight/Pexels.

Precisamos dar um basta nisso! Como uma pessoa que reconhece o potencial afrofuturista, está na hora de pensarmos não apenas nos pesadelos como forma de percepção da realidade. Ter uma metanoia que nos prontifique como nação é um importante passo a ser dado, começando com o poder e potencial de nossas histórias!

Se você está lendo esse texto, você escolheu estar em um lugar saudável de notícias do Nordeste. Você superou uma grande massa de pessoas para estar se informando, então reconheça que seu lugar é diferenciado! Compreenda que suas escolhas valeram a pena. Reconheça que o sistema é osso, mas se mova em direção a isso. O rapper 50 Cent fez um CD chamado “Get Rich or Die Tryin’”; apesar de eu não ser o maior fã dessa música eu indico ouvirem e compreenderem a música “Many Man”. Ela é agressiva mas fala dos conflitos de ser uma pessoa negra, isso se estende não somente aos negros em zonas periféricas mas sobre os negros em ascensão, um caminho solitário onde até o divino não se faz presente.

Foto: Elevate/Pexels.

Por fim, reconhecer nossas qualidades e defeitos, por meio disso confiar no que sabemos fazer, valorizar o que fazemos e compreender nossa realidade de forma não generalista, são passos muito importantes para que possamos compreender a autoestima. Tudo que falei acima são formas de refletirmos sobre nossas narrativas, reconhecer dificuldades e acolher a nós mesmos. Afinal, nossa mudança concreta e real é facilitada quando conhecemos a nós mesmos, sem cair nas premissas e falácias brancas.

“⁠É a autoridade da estética branca quem define o belo e sua contraparte, o feio, nesta nossa sociedade classista, onde os lugares de poder e tomada de decisões são ocupados hegemonicamente por brancos”

Neusa Santos (1948-2008)

*Esse conteúdo é um artigo colaborativo do psicólogo e palestrante Fernando de Oliveira

Foto de capa: Joshua Mcknight/Pexels.

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